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No dia 2 de novembro dezenas de flores são vendidas. As vendas superam datas importantes como o dia das mães. Estima-se que cerca de 6 mil pessoas passem pelo cemitério da área urbana em Teresópolis. A situação se repete por todo o país. Ao observar o número fiquei pensando... Imagine uma casa cheia de gente ( Pare um pouco. Isso! É pra imaginar mesmo!). Pais, filhos, tios, netos, sobrinhos, amigo do tio da prima. O almoço tumultuado saindo quase às três da tarde. O cachorro correndo pela casa, enquanto a matriarca pede silêncio e balança a criança. Dois netos abraçam o avô. A filha mais velha vem de longe e traz o genro para conhecer a família. Todos se reúnem à uma mesa horizontal repleta de delicias. No centro um bolo colorido celebra o aniversário de 90 anos da avó. Posso ouvir as gargalhadas daquela tia notável e um tanto quanto inconveniente... Consegue ouvir?

Penso também naquela mocinha que abriu mão da faculdade para ficar com o pai cuja visão foi prejudicada pelo tempo. Vendeu a passagem da viagem para praia na rede social a fim de curtir o natal em casa, com a família. Chamou os amigos. Todos se reuniram na sala ao som do violão meio desafinado do colega - enquanto aguardavam o frango assar no forno velho. E riram, muito, até altas horas da manhã.

Acredito que pessoas que demonstraram e receberam amor em vida sofrem a perda todos os dias. Alguns mais, outros menos, mas é uma ferida que não cessa. Há momentos em que a lembrança vem sem motivo aparente. Vem cortando como o vento sobre o corpo nu. Então a gente sente aquele gosto amargo da falta e se lembra daquilo que já teve. Até passa pela cabeça, confesso, que poderia ter feito mais, porém as boas memórias superam as más.

Quem não deu amor tem mais motivos para chorar. Tira um dia só pra lembrar que devia ter amado mais. Chora litros de lágrimas - e cada uma delas carrega sinceridade absoluta. Dói mesmo... já senti essa dor... as coisas que não aconteceram, os abraços, os sorrisos, o carinho que não demos fere mais do que tudo de bom que fizemos. Somos extremamente julgadores conosco. Muitas vezes não perdoamos os próprios erros e por isso não aprendemos com eles!

Felizes são os que valorizam os pais e distribuem carinho aos filhos e amigos enquanto vivos. Felizes aqueles que parcelam presentes em todas as datas comemorativas só pra não deixarem as datas festivas passarem em branco. Que pegam uma rosa no jardim e presenteiam sem razão. Que fazem cartas manuscritas e enfeitam com coração. (...) Que chegam em casa com doce.

Parte de nós aprende a valorizar na reta final, quando não há mais tempo. Desde a hora em que nascemos, seguimos numa contagem regressiva com a morte. Menos 29, menos 30, menos 31... Tenho hoje menos 32. E desde a perda irreparável, há cerca de 16 anos, tenho amado mais. Perdi tempo demais na primeira parte da vida... Diria que 80% das coisas que eu sei hoje, não sabia. E nunca saberemos tudo! Não fazemos ideia, por exemplo, de quanto tempo ainda nos resta!

Por isso ame. Chore de rir. Plante um abraço. Use aquela roupa com etiqueta que está no armário. Fale alto. Gargalhe vez em quando. Dê uns gritos! Bata palma. Faça selfie com a família. Role da grama com a criança. Cheire a pata do cachorro. Suje a roupa. Deixa a pia na louça. Visite um amigo. Vá à casa de parentes. Largue um pouco o whatsapp e foque no mundo real. Porque uma coisa é certa: as flores depois da morte jamais substituirão os abraços que deveriam ter sido dados em vida. Não há dinheiro que pague isso!

Agora, se perdeu a chance, marque uma data no ano, como essa, e chore bastante. No dia seguinte, esqueça a dor! Seria doloroso demais conviver com isso diariamente... Mas é importante atentar para duas coisas: a primeira - tem a oportunidade de fazer diferente a partir de hoje. A morte física é inevitável, o remorso não; a segunda - o cronômetro em direção ao término da vida já foi acionado. Quanto tempo perdeu até agora?


Carol Rocha é jornalista e se sente reflexiva.

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